Veja se este texto o ajuda a tirar as dúvidas... Para quem trabalha em rádio e não acredita no futuro da mesma, dá que pensar...
Terceira Vida da Rádio
A chegada da Internet não veio apenas criar o ambiente certo para fazer surgir títulos da imprensa escrita com variantes da interrogação O fim da Imprensa?. Quase que num decalque daquilo que a própria imprensa havia escrito sobre si mesma, assistimos nos últimos meses ao surgir da interrogação O fim da Rádio?. Ambas as perguntas fazem sentido. mas apenas porque importa interrogarmo-nos e não tanto estar convencido do fim antecipado de qualquer um dos media contemporâneos. Os jornais que hoje conhecemos são diferentes dos de há 20 anos e de 70 anos, a rádio também o é. O que a história dos media nos ensina é que regularmente os media se inovam, no entanto há inovações mais abruptas do que outras, em particular quando o anterior modelo de negócio dá sinais de se esgotar e se procura o próximo.
Mas retornemos à rádio e à sua actual terceira vida. A rádio é considerada por muitos autores como um meio de futuro e também eu creio que o que assistimos é à sua vitalidade e não ao seu desaparecimento, daí que concorde com Enrico Menduni sobre a rádio como um media de futuro.
Começando pelas duas anteriores vidas da rádio há em grande medida uma semelhança entre a primeira vida da Rádio e a Internet. Quando Berthold Brecht, dramaturgo alemão, considerava nos anos 30 que a rádio era um media de liberdade afirmava-o convicto que o uso pelos cidadãos das frequências disponíveis para emitirem o que quisessem e dar azo à criação era uma das grandes conquistas do século XX. O surgir de regimes de inspiração ditatorial, por quase toda a Europa, fez esse argumento esboroar-se e parecer mais um desejo do que uma realidade, dando ao mesmo tempo origem à primeira idade da rádio: a idade das grandes emissoras de carácter nacional, detidas maioritariamente pelo estado, mas também nalguns contextos nacionais por entidades privadas.
A segunda idade da rádio foi aquela que teve como auge o período da difusão da micro-electrónica a preços acessíveis, a qual, em conjunto com movimentos sociais das décadas de setenta e oitenta do século XX trouxe ao panorama internacional a possibilidade do surgimento das chamadas rádios piratas. Rádios essas, que num segundo momento foram em parte assimiladas pelo status quo dos media dando origem à institucionalização de novas empresas radiofónicas de emissão local, regional e nacional. De novo aí o ideário de Berthold Brecht teve um regresso, ainda que fugaz, ao tecido social para depois, por motivos diferentes dos da década de trinta, voltar a submergir.
A terceira vida da rádio foi antecipada pela chegada de uma nova tecnologia: a Internet. A Internet tal como a Rádio foi algo de um discurso similar sobre as suas capacidades libertadoras da criatividade e da comunicação humana. E em grande medida foi capaz de viver, até hoje ao nível das expectativas criadas pelo seu discurso. Embora tecnologicamente diferentes no seu âmago, as duas tecnologias de massa mais similares nas suas características de proximidade e criação de laços sociais são de facto a Internet e a Rádio. Daí que a resposta às diferentes variantes sobre O fim da rádio só possam ter como resposta que a Internet não matou a rádio mas deu-lhe uma terceira vida. Uma vida diferente das anteriores, é claro. Mas uma nova vida sem dúvida. Uma vida alicerçada no facto de a rádio ser o media que mais facilmente se adapta à Web 2.0.
A argumentação em torno desta possibilidade, já explorada inclusive por rádios cuja origem remonta às décadas anteriores à segunda guerra mundial, está directamente relacionada com a questão da publicidade na Internet. Agências, mediadores, anunciantes (e também os próprios media) se têm interrogado sobre como obter ganhos com a publicidade na Internet. Uma resposta comprovada é a articulada pelas rádios que a partir das suas comunidades de ouvintes criaram online novos espaços para as comunidades que se podem formar em torno dela num novo ambiente. As estratégias utilizadas são muitas e vão do download ou streaming de vídeos das músicas que se encontram a tocar na emissão num dado momento, intervaladas com publicidade até à utilização da primeira página para os blogues alojados no servidor da rádio que mais comentários possuírem por parte da comunidade de ouvintes.
A rádio é também o espaço que mais facilmente, num contexto nacional, pode competir com redes sociais como o myspace.com na descoberta de novos talentos musicais e também é o espaço, por excelência, para a partilha de receitas com os artistas que seguem o modelo livre de editora. È claro que nem todas as rádios estarão preparadas para este novo modelo ou, se quisermos, vida. As rádios que nas suas emissões mais apostam na intimidade com os seus ouvintes são, porventura, as que melhor podem passar à criação de comunidades online. O sucesso está em conseguir criar redes alargadas, ou seja, chamar os seus ouvintes até esses espaços, num processo lento e de respeito para com essa relação e ao mesmo tempo diversificar para outros espaços falantes de português ou onde portugueses se encontrem, pois os espaços virtuais tais como os outros espaços precisam de diversidade para atraírem novos elementos e consolidarem as redes.
Estará a sua rádio, a rádio que ouve, preparada para essa nova vida? Se ao ler este texto tudo isto lhe parecer aplicável então provavelmente ela estará e será essa uma das formas de rádio com que as novas gerações de ouvintes irão crescer.
1 comentario
Anónimo -
Terceira Vida da Rádio
A chegada da Internet não veio apenas criar o ambiente certo para fazer surgir títulos da imprensa escrita com variantes da interrogação O fim da Imprensa?. Quase que num decalque daquilo que a própria imprensa havia escrito sobre si mesma, assistimos nos últimos meses ao surgir da interrogação O fim da Rádio?. Ambas as perguntas fazem sentido. mas apenas porque importa interrogarmo-nos e não tanto estar convencido do fim antecipado de qualquer um dos media contemporâneos. Os jornais que hoje conhecemos são diferentes dos de há 20 anos e de 70 anos, a rádio também o é. O que a história dos media nos ensina é que regularmente os media se inovam, no entanto há inovações mais abruptas do que outras, em particular quando o anterior modelo de negócio dá sinais de se esgotar e se procura o próximo.
Mas retornemos à rádio e à sua actual terceira vida. A rádio é considerada por muitos autores como um meio de futuro e também eu creio que o que assistimos é à sua vitalidade e não ao seu desaparecimento, daí que concorde com Enrico Menduni sobre a rádio como um media de futuro.
Começando pelas duas anteriores vidas da rádio há em grande medida uma semelhança entre a primeira vida da Rádio e a Internet. Quando Berthold Brecht, dramaturgo alemão, considerava nos anos 30 que a rádio era um media de liberdade afirmava-o convicto que o uso pelos cidadãos das frequências disponíveis para emitirem o que quisessem e dar azo à criação era uma das grandes conquistas do século XX. O surgir de regimes de inspiração ditatorial, por quase toda a Europa, fez esse argumento esboroar-se e parecer mais um desejo do que uma realidade, dando ao mesmo tempo origem à primeira idade da rádio: a idade das grandes emissoras de carácter nacional, detidas maioritariamente pelo estado, mas também nalguns contextos nacionais por entidades privadas.
A segunda idade da rádio foi aquela que teve como auge o período da difusão da micro-electrónica a preços acessíveis, a qual, em conjunto com movimentos sociais das décadas de setenta e oitenta do século XX trouxe ao panorama internacional a possibilidade do surgimento das chamadas rádios piratas. Rádios essas, que num segundo momento foram em parte assimiladas pelo status quo dos media dando origem à institucionalização de novas empresas radiofónicas de emissão local, regional e nacional. De novo aí o ideário de Berthold Brecht teve um regresso, ainda que fugaz, ao tecido social para depois, por motivos diferentes dos da década de trinta, voltar a submergir.
A terceira vida da rádio foi antecipada pela chegada de uma nova tecnologia: a Internet. A Internet tal como a Rádio foi algo de um discurso similar sobre as suas capacidades libertadoras da criatividade e da comunicação humana. E em grande medida foi capaz de viver, até hoje ao nível das expectativas criadas pelo seu discurso. Embora tecnologicamente diferentes no seu âmago, as duas tecnologias de massa mais similares nas suas características de proximidade e criação de laços sociais são de facto a Internet e a Rádio. Daí que a resposta às diferentes variantes sobre O fim da rádio só possam ter como resposta que a Internet não matou a rádio mas deu-lhe uma terceira vida. Uma vida diferente das anteriores, é claro. Mas uma nova vida sem dúvida. Uma vida alicerçada no facto de a rádio ser o media que mais facilmente se adapta à Web 2.0.
A argumentação em torno desta possibilidade, já explorada inclusive por rádios cuja origem remonta às décadas anteriores à segunda guerra mundial, está directamente relacionada com a questão da publicidade na Internet. Agências, mediadores, anunciantes (e também os próprios media) se têm interrogado sobre como obter ganhos com a publicidade na Internet. Uma resposta comprovada é a articulada pelas rádios que a partir das suas comunidades de ouvintes criaram online novos espaços para as comunidades que se podem formar em torno dela num novo ambiente. As estratégias utilizadas são muitas e vão do download ou streaming de vídeos das músicas que se encontram a tocar na emissão num dado momento, intervaladas com publicidade até à utilização da primeira página para os blogues alojados no servidor da rádio que mais comentários possuírem por parte da comunidade de ouvintes.
A rádio é também o espaço que mais facilmente, num contexto nacional, pode competir com redes sociais como o myspace.com na descoberta de novos talentos musicais e também é o espaço, por excelência, para a partilha de receitas com os artistas que seguem o modelo livre de editora. È claro que nem todas as rádios estarão preparadas para este novo modelo ou, se quisermos, vida. As rádios que nas suas emissões mais apostam na intimidade com os seus ouvintes são, porventura, as que melhor podem passar à criação de comunidades online. O sucesso está em conseguir criar redes alargadas, ou seja, chamar os seus ouvintes até esses espaços, num processo lento e de respeito para com essa relação e ao mesmo tempo diversificar para outros espaços falantes de português ou onde portugueses se encontrem, pois os espaços virtuais tais como os outros espaços precisam de diversidade para atraírem novos elementos e consolidarem as redes.
Estará a sua rádio, a rádio que ouve, preparada para essa nova vida? Se ao ler este texto tudo isto lhe parecer aplicável então provavelmente ela estará e será essa uma das formas de rádio com que as novas gerações de ouvintes irão crescer.
Gustavo Cardoso